Portal da Família
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Éramos mais felizes |
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Carlos Roberto Severo |
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Quanto mais o tempo passa, mais convicto fico de que éramos mais felizes há 20 ou 30 anos atrás. Não tínhamos toda essa facilidade que pipoca ao nosso lado, dia-a-dia. A televisão era preto e branco e ficávamos em êxtase, aos sábados, assistindo a sessão da tarde com suas séries fantásticas. O matiné do Cisne, do Avenida, do Municipal era o programa do domingo, que a maioria fazia uma vez ao mês e onde a gurizada aproveitava para trocar seus gibis ou aquelas figurinhas que estavam em duplicidade e dar aquela olhada para a menina dos seus sonhos sem ter por perto o professor ou a mãe da garota. Nos nossos bolsos, trazíamos apenas os trocados para a entrada e os mais afortunados, também para o sorvete ou para a pipoca. Éramos, sem dúvida alguma, muito mais felizes. Não precisávamos nada mais do que isso para nos sentir privilegiados. Não importava se tivéssemos que usar a velha e surrada "conga" ou um "kichute" já desgastado pelas "peladas" nas quadras do Missões, do Polivalente ou do "Industrial". Telefone então! Raro era o guri com 15, 16 anos que já tivesse falado num. Piscina era coisa para quem fosse muito rico ou sócio do Galerno. Nossos finais de semana resumiam-se a essas coisas e já estávamos mais que felizes, com o churrasco no almoço de domingo, onde era certo que haveria vários copos de "Q-Suco" ou até mesmo de Grapete ou Minuano Limão. A gurizada criada com mais liberdade, tinha o privilégio de jogar bola ou bolita nas tardes domingueiras, desde que antes das 18 horas, já estivessem de banho tomado e com os temas em andamento, coisa sagrada para qualquer estudante. Isto valia também para as gurias, que ao contrário da piazada, limitavam-se ao matiné eventualmente e as visitas, que a maioria detestava, aos parentes, mas éramos felizes. Não importava o quanto era difícil encontrar nos velhos livros da Biblioteca Municipal, aquele assunto determinado pelo professor. Para nós era uma oportunidade ímpar de sair das quatro paredes. Íamos como quem vai a uma festa. Nos debruçávamos sobre os livros e líamos para depois fazer a síntese do assunto determinado e ai daquele que simplesmente copiasse. O Professor não tinha dúvidas e nem compaixão. Era zero na certa. Não nos fazia falta toda essa tecnologia que disponibilizam hoje em dia e que na verdade acaba por nos tornar reféns dela. Éramos felizes sem ter no bolso um telefone, sem ter ao alcance de um simples toque, todo um universo de informações que a "internet" coloca a nossa frente num piscar de olho. Éramos mais felizes respondendo as provas impressas no velho e "cheiroso" mimeógrafo a álcool. Nos contentávamos com uma ou duas horas de televisão ao dia, isso se conseguíssemos sintonizar a TV Gaúcha canal 12. Crescíamos assim. Felizes! Para sabermos, necessitávamos de leitura e líamos muito. Era comum encontrar adolescente com 12, 13 anos, que já haviam devorado toda a obra de Machado de Assis, Jorge Amado, José de Alencar e muitos outros. E os presentes então! Geralmente era roupa, - assim no singular, uma camisa ou uma calça, comprada nas Casas Pernambucanas ou na Algodoeira, escolhida com um único critério, durabilidade! Tínhamos que nos contentar com as escolhas, quase sempre contrárias ao nosso gosto. Hoje não!
Independente da classe social, opinião de pais ou dos "mais velhos", só é ouvida por educação, isso quando ouvem, porque a grande maioria nem mesmo isso. Pais, professores, irmãos mais velhos, todos são considerados ultrapassados e isso significa, também, sem direito a opinar. E a roupa! Não tente dar de presente esse artigo, a não ser que conheças profundamente a pessoinha. Com a facilidade do cartão de crédito, as modalidades de crediário e a grande variedade de opções, fizeram com que eles - a moçada, se tornassem verdadeiros modelos. Vestem-se de acordo com o padrão "Global", por mais ridículo que isso possa parecer e não possuem só algumas "mudas de roupa", como era na nossa época. Seus roupeiros é de dar inveja a qualquer figurinista. Nele se encontra de tudo um pouco. O das gurias está repleto de pequenas peças, todas parecendo menores que a pessoa que irá usar, já o dos guris, ao contrário do das gurias, se resume a várias bermudas, todas maiores que uma bombacha, grandes camisetas que poderiam muito bem se transformar em barracas de acampamento e grandes pares de tênis, que eles usam com os cadarços desamarrados, sabe-se lá como. E tudo isso para que? Converse com alguém com 15, 16 anos, e se tiveres sorte e conseguires emplacar um diálogo intelegível, "tipo assim...", você só ouvirá reclamações. Estão todos "entediados", descontentes, querendo mais e mais... Contentá-los é qualquer coisa entre o impossível e o surreal. Faça um teste! Fique ouvindo o que eles conversam por alguns minutos, se seus ouvidos aguentarem, e verás que a nossa língua está fadada ao insucesso, tal é a forma com que eles a maltratam... E nós, alijados de qualquer ação, assistimos a tudo, meio atônitos, sem saber bem o que está acontecendo. Quero de volta todo o pouco que tivemos. Eu era muito mais feliz quando saia e ao encontrar um brigadiano, procurava andar com muito cuidado, porque ali estava uma autoridade que me protegia e punia aos malfeitores e os meninos bagunceiros. Quero poder ouvir com mais freqüência a frase "Sim senhor!", já tão escassa no nosso dia-a-dia. Quero voltar a ter medo apenas do resfriado, quando durmo com a janela aberta. Quero um grande sorriso, quando eu der um abraço de reconhecimento e não a expectativa de um grande presente por uma obrigação executada. Hoje é assim! Poucos são os que se sentem devidamente recompensados com um fraterno abraço. Mais vale um CD do momento que um beijo paternal. Quero de volta a conversa franca do olho no olho, onde um aperto de mão selava um compromisso inabalável. Quero poder reencontrar a confiança total em todos aqueles que me cercam. Quero que guris e gurias, sejam guris e gurias e não assaltantes, estupradores e prostitutas e principalmente não quero mais ouvir essa frase medonha e nefasta, - os tempos são outros, - última alternativa dos irresponsáveis e inconseqüentes. O tempo até pode ser outro, mas os valores são os mesmos. Não foi suprimido o respeito, a dignidade, o caráter. Não se decretou que meninas de 12 ou 13 anos, que mal saíram das fraldas, devam fazer sexo, fumar maconha, só porque isso se tornou moda nos grandes centros, já decadentes e sem rumo, do País ou porque isso é tratado por pseudos intelectuais, com a maior naturalidade em horário nobre da televisão. Invadem nosso mundo e "estupram" a inocência de nossos filhos com falsas facilidades, destruindo nossa cultura, atropelando nossas benditas diferenças regionais e culturais, construídas ao longo dos séculos. Quero poder novamente ver na televisão aquelas enfadonhas séries maniqueístas, na luta permanente contra o mal e não a apologia ao descaramento, ao sexo fácil, a competição entre quem "transa" mais rápido com o professor, ou quem beijará mais rapazes e moças no recreio da escola e o pior de tudo isso, com a conivência de mães e pais que, para se eximirem das conseqüências, limitam-se a colocar alguns preservativos na bolsa dos seus filhos. Todos, pais e mães, verdadeiros crápulas incestuosos. Melhor seria que tivessem sido impedidos de procriar. Tenho certeza que, quem ama realmente seus filhos, deveria dizer com mais freqüência a palavra não. Alias o "não" nesse caso, quando dito pela boca de um pai ou uma mãe, deveria ser sinônimo de amor. Em 2007, cuidemos mais dos nossos filhos. Sejamos mais pais e mães e menos seres provedores. Antes de sermos amigos de nossos filhos, somos pais. E pais distinguem-se dos amigos exatamente por um detalhe, é deles a responsabilidade de formar cidadãos para a vida. |
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Carlos Roberto Severo reside em Santo Ângelo-RS - Brasil E-mail: crsevero@san.psi.br Publicado no Portal da Família em 11/01/2007 |
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